Pela intensidade do Sol, pela homogeneidade desse céu azulzinho, eu já desconfiava que você tava passando. É da natureza das nuvens. Ficar em suspensão, ir se desmontando, desconfigurando-se na sua própria dispersão. Nuvem linda, com os olhos mais sonolentos que eu já vi! Olhos repletos da insônia de quem tá vagando, vagando, sem conseguir parar. Foi pouco, mas foi bom esse pedaço de tempo que você esteve circundando a minha superfície rasa. Acordar te procurando, mais do que preencher qualquer extensão indefinida de mim, esvaziava o meu vazio. Ufa! Eu sou mesmo uma criança boba, querendo brincar com nuvens. Mas eu não resisti. Eu não quis resistir. Igualzinho nos desenhos dos meus livros da terceira série, eu queria ser um anjo dourado deitado na nuvenzinha macia. E essa sensação de te querer era tão maior do que o medo de não poder. Mas, de repente, me dei conta de que não dava mais pra brincar disso. Aliás, me dei conta de que não conheço as regras dessa brincadeira. Fui traída pelo meu desejo seguro, pelo meu sonho desperto. Não fui traída por você, nuvem branca, que nunca me prometeu nada. Não prometeu me levar contigo nesses teus passeios infindáveis. Não prometeu me levar pra conhecer os teus caminhos secretos. Eu queria tanto! Mas você foi uma nuvem querida e sincera, e isso só aumenta o meu lamento. Não tive tempo de te decifrar, nuvem turva, que eu só consegui tocar com os lábios molhados e o corpo quente.
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Hoje, uma nuvem escura veio visitar o meu peito. Tá fazendo chover aqui dentro, transbordando por onde pode. Mas logo, logo, passa. É da natureza das nuvens.
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