segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Machado de Assis em poucas palavras

Hoje é aniversário do centenário de morte de Machado de Assis. Quem acompanha o mundo das Letras sabe que não se fala em outra coisa, desde que o ano começou. E os clichês se repetem em tudo quanto é reportagem, afinal os comentaristas/literatos/críticos/professores já esgotaram o repertório. Professor Pasta, que sabe tudo do "bruxo do Cosme Velho", ou sobre "o negro, pobre, gago e epilético que se transformou no maior escritor de nossa literatura" (haja papagaio pra repetir isso!) deve achar graça. Eu acho! Até porque Machado foi mesmo o maior sociólogo desse país. Não dá pra entender o Brasil sem Machado (xiiiii, mas isso também é clichê!). Pra não correr risco de ficar falando bobagem, então, me lembro de duas coisas que me marcaram na obra do "mestre" (sem essa palavra não se fala em Machado). A primeira foi, durante a releitura de Dom Casmurro, descobrir que Capitu era inocente. Sim, eu descobri! Vocês ainda têm dúvidas? Capitu não traiu Bentinho (ainda que ele merecesse). O doido do Bento Santiago era completamante descontrol, tadinho! Outra coisa que me lava a alma em Machado é a ironia. Característica básica e fundamental de boa parte da narrativa de seus personagens, a ironia é que torna sua obra literatura, e não tratado de sociologia.

Essa doce melodia

Pra você,

Não suporto mais tua ausência
Já pedi a Deus paciência ...

Pra não deixar o samba morrer

Deixei passar vários assuntos que me sacudiram o espírito nas últimas semanas, como o impacto de ter assistido ao "O Ensaio sobre a Cegueira", a decepção com "Devoção" e a beleza do "Revelando São Paulo". Mas não dá pra deixar a falta de inspiração e a preguiça dominarem tanto, ao ponto de me calar diante da maravilha que é O Mistério do Samba . O documentário de Lula Buarque de Holanda, conduzido por Marisa Monte, passeia pelo bairro carioca de Osvaldo Cruz, berço da Portela, e nos leva sentidos adentro por uma viagem musical que se descobre ali, na hora exata em que a Velha Guarda da Escola abre suas portas de casas simples e suas caixas esquecidas com muitos sambas inéditos. Casquinha, Argemiro, Dona Surica, Áurea, Zeca Pagodinho e Monarco são apenas alguns dos personagens que nos emocionam. A rabugice de Dona Eunice, que diz que "esse negócio de amor vira a cabeça das pessoas" chega a ser engraçada. Argemiro canta um samba triste, triste, e alguém comenta que a história da música é de chorar. A resposta é evidente: "sem tristeza não se faz samba bonito". A voz de Marisa Monte aparece em algumas rodas de samba, acompanhada pelas pastoras da Portela, ou pelo violão de Paulinho da Viola. Que voz! Divina e graciosa! O Mistério do Samba nos dá vontade de passear pelo Rio que não é o Leblon. E de sair cantarolando as canções desses homens simples, operários da vida e do samba!



Samba
Velho amigo e companheiro
Alegria dos nossos terreiros
Há muitos anos atrás
É este o mesmo samba verdadeiro
Que partiu para o estrangeiro
E penetrou nas camadas sociais
Samba do Estácio e Ismael
De Cartola e Mestre Paulo
Bide, Mano Rubem e Noel
Estácio, Mangueira e Portela
Tijuca, Favela
Os professores do morro
Nos mesmos ideais
Fizeram a grande alegria
Dos carnavais
Foi aí que o samba evoluiu
Como representante maior
Da cultura do Brasil

(Samba, Velho Amigo - Monarco)

Florescer

Demorei pra voltar a este canto. Saí do verão mais amazônico do país e aterrissei neste demorado inverno paulistano, que não quer ceder à primavera. Tenho aguentado bem. Café expresso e cachecol. Mas meu coração tá em choque térmico. Tá pulsando cansado, nostálgico, sem entender direito esse vai-e-vem de emoções. O jeito é viver todos os invernos de uma só vez. Vou tomar chá, emprestar a alegria dos sorrisos das crianças e a melancolia de canções antigas. Vou vestir meias grossas e luvas, se for preciso. E seguir em frente. Vou abraçar todas as ausências que quiserem me fazer companhia. Vou visitar de novo as paisagens daquele deserto tão familiar. O deserto é refúgio, às vezes. Mas agora eu sei que o inverno vai passar. O amor sempre floresce, quando plantado em nós. Rego meu imenso amor com lágrimas de saudade. E adubo com a certeza de que, no frio e no calor, vale à pena esperar pelas flores.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Partida

O que será ser só
Quando outro dia amanhecer
Será recomeçar
Será ser livre sem querer
O que será ser moça
E ter vergonha de viver

Ter corpo pra dançar
E não ter onde me esconder
Tentar cobrir meus olhos
Pra minh'alma ninguém ver
Eu toda a minha vida
Soube só lhe pertencer

O que será ser sua sem você
Como será ser nua em noite de luar
Ser aluada, louca
Até você voltar
Pra quê

O que será ser só
Quando outro dia amanhecer
Será recomeçar
Será ser livre sem querer
Quem vai secar meu pranto
Eu gosto tanto de você

(Abandono - Edu e Chico)

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Chegou!

Vai minha tristeza
E diz a ela que sem ela não pode ser
Diz-lhe numa prece
Que ela regresse
Porque não posso mais sofrer
Chega de saudade
A realidade é que sem ela
Não há paz
Não há beleza
É só tristeza e a melancolia
Que não sai de mim
Não sai de mim
Não sai
Mas, se ela voltar
Se ela voltar que coisa linda!
Que coisa louca!
Pois há menos peixinhos a nadar no mar
Do que os beijinhos
Que eu darei na sua boca
Dentro dos meus braços, os abraços
Hão de ser milhões de abraços
Apertado assim, colado assim, calada assim,
Abraços e beijinhos e carinhos sem ter fim
Que é pra acabar com esse negócio
De viver longe de mim
Não quero mais esse negócio
De você viver assim
Vamos deixar esse negócio
De você viver sem mim...

Tom Jobim - Chega de Saudade

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Pega aí!

Para T.C.P.S.

Chega de agonia. Não há galho de goiabeira (nem de castanheira, pitangueira ou sumaumeira) que me impeçam de te namorar. Amarrei meu coração numa pedra e mandei pelo ar. Nenhuma chance dele se enroscar. Mas ainda leva uns três dias pra te alcançar ...

Havia um muro alto entre nossas casas.
Difícil de mandar recado para ela.
Não havia e-mail.
O pai era uma onça.
A gente amarrava o bilhete numa pedra presa porum cordão
E pinchava a pedra no quintal da casa dela.
Se a namorada respondesse pela mesma pedra
Era uma glória!
Mas por vezes o bilhete enganchava nos galhos da goiabeira
E então era agonia.
No tempo do onça era assim.

(Manoel de Barros - A namorada)

Um dia comum

A saudade atropelou a ansiedade, que atropelou a si mesma. E assim, meu desejo, agora tão palpável, tão ao meu alcance, me deu trégua pra descansar. Pra esperar com o coração sossegado, andar pelos dias, tomar café com leite, ler uma revista no metrô. Trabalhar com alegria e enxergar os cantinhos onde se escondem os pequenos prazeres. Ou, simplesmente, abandonar a miopia. Rever as paisagens batidas, as ruas de sempre, todas tão mais ensolaradas. Há tão pouco tempo me engoliam e, hoje, me abriram um sorriso. Devolvo a gentileza e isso me enche os pulmões. Reconheço um rosto amigo numa portaria, numa lanchonete, nessa minha vida que surpreende, sem espantar. Queria poder caminhar sempre leve assim. E vou tentar. Posso até me lembrar de respirar devagar, corrigir a postura. Andar altiva pela tarde e retribuir, um pouquinho que seja, toda a beleza de um dia comum.