segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Louco é quem não diz

É muito fácil enlouquecer
A loucura anda por aí; sempre à espreita, sempre com fome
Anda seus passos surdos, discreta, matreira
Daqueles que já sucumbiram ela faz o que bem quer
Qual dona-de-casa mandona, impõe a ordem dos móveis e a cor das paredes
E assim, desafiante, dominadora, desfila suas formas sinuosas
Há os que seguem aos berros, sujos e despidos
vociferando impropérios, rindo do mundo limpo e são
Há os que repetem as vozes de todos os demônios
que a dona da casa convidou pra almoçar
E há ainda os que babam, urinam, defecam,
peidam e escarram, sem se esconder, sem se importar
Aliás, a loucura não quer saber se haverá quem os limpe,
quem os lave e lhes dê de comer
Ela só quer reinar soberana, exercer seu mandato
A ordem dessa senhora pode ter contornos menos brutos, mais elaborados: a angústia que arde, a crueldade que dorme, a depressão que derrota
Não se sabe ao certo se a loucura escolhe ou é escolhida
Apenas que se embrenha através dos excessos: os fracos demais, os indiferentes demais e os que pensam demais
Outra coisa da qual se tem certeza é que a loucura se alimenta dia a dia, nos comedouros imundos do mundo
Mundo que exalta os ricos, os bem-sucedidos, os impecáveis em trajes de festa
Mundo que rejeita a solidão e vende felicidade como um bem de consumo
Mundo que despreza os poetas, os desregrados e os justos
O mundo engorda a loucura
E ela está cada dia mais forte, valente, potente
Exatamente como o mundo quer
E sempre com fome, sempre à espreita
Somos todos terrenos férteis, produtivos
protegidos por cercas sem eletrificação e cães desdentados
Onde será o próximo acampamento?

Um comentário:

Anônimo disse...

Lu, caraca...parece até meus escritos no Caindo pra Cima. De silenciar.
Beijos